De modo geral as figuras de linguagem são empregadas
para estilizar, dar um enfoque mais original ao texto. Trata-se de um recurso
utilizado pelo escritor na abordagem de experiências comuns de formas
diferentes, conferindo emotividade e contornos poéticos às suas escritas.
As figuras de linguagem podem ser classificadas em:
a) figuras de palavras;
b) figuras de som;
c) figuras de pensamento;
d) figuras de sintaxe.
FIGURAS DE PALAVRAS
A figura de palavra consiste na substituição de
uma palavra por outra, isto é, no emprego figurado, simbólico,
seja por uma relação muito próxima (contiguidade), seja por uma
associação, uma comparação, uma similaridade.
Comparação: Consiste em aproximar
dois elementos a partir de uma característica em comum, dá-se a partir de
conetivos comparativos explícitos.
“Amou daquela vez como se
fosse máquina
Beijou sua mulher como se
fosse lógico”
Chico
Buarque
“As solteironas, os longos vestidos negros fechados
no pescoço, negros xales nos ombros, pareciam aves
noturnas paradas..."
Jorge Amado
Metáfora: A metáfora consiste
em utilizar uma palavra ou uma expressão em lugar de outra, sem que haja uma
relação real, mas em virtude da circunstância de que o nosso espírito as
associa e depreende entre elas certas semelhanças.
É importante notar que a metáfora tem um caráter subjetivo e momentâneo;
se a metáfora se cristalizar, deixará de ser metáfora e passará a ser catacrese
(é o que ocorre, por exemplo, com "pé de alface", "perna da
mesa", "braço da cadeira").
Obs.: toda metáfora é uma espécie de comparação implícita, em
que o elemento comparativo não aparece.
Exemplo:
As luzes brilhantes olhavam-me.
Há substituição da palavra olhos por luzes
brilhantes. Essa é a verdadeira metáfora.
Observe outros exemplos:
1) "Meu pensamento é um rio subterrâneo." (Fernando
Pessoa)
Nesse caso, a metáfora é possível na medida em que o poeta estabelece
relações de semelhança entre um rio subterrâneo e seu pensamento (pode estar
relacionando a fluidez, a profundidade, a inatingibilidade, etc.).
2) Minha alma é uma estrada de terra que leva a lugar algum.
Uma estrada de terra que leva a lugar algum é, na frase acima,
uma metáfora. Por trás do uso dessa expressão que indica uma alma rústica e
abandonada (e angustiadamente inútil), há uma comparação subentendida: Minha
alma é tão rústica, abandonada (e inútil) quanto uma estrada de terra que leva
a lugar algum.
Metonímia: A metonímia consiste em empregar um
termo no lugar de outro, havendo entre ambos estreita afinidade ou relação de
sentido. Observe os exemplos abaixo:
1 - Autor pela obra:
Gosto de ler Machado de Assis. (= Gosto de ler a obra
literária de Machado de Assis.)
2 - Inventor pelo invento: Édson ilumina o mundo. (= As lâmpadas iluminam
o mundo.)
3 - Símbolo pelo objeto simbolizado: Não te afastes da cruz. (= Não
te afastes da religião.)
4 - Lugar pelo produto do lugar: Fumei um saboroso havana. (= Fumei
um saboroso charuto.)
5 - Efeito pela causa: Sócrates bebeu a morte. (= Sócrates
tomou veneno.)
6 - Causa pelo efeito: Moro no campo e como do meu trabalho. (=
Moro no campo e como o alimento que produzo.)
7 - Continente pelo conteúdo: Bebeu o cálice todo. (= Bebeu
todo o líquido que estava no cálice.)
8 - Instrumento pela pessoa que utiliza: Os microfones foram
atrás dos jogadores. (= Os repórteresforam atrás dos jogadores.)
9 - Parte pelo todo: Várias pernas passavam apressadamente. (=
Várias pessoas passavam apressadamente.)
10 - Gênero pela espécie: Os mortais pensam e sofrem
nesse mundo. (= Os homens pensam e sofrem nesse mundo.)
11 - Singular pelo plural: A mulher foi chamada para ir
às ruas na luta por seus direitos. (= As mulheres foram chamadas,
não apenas uma mulher.)
12 - Marca pelo produto: Minha filha adora Danone. (= Minha filha
adora o iogurte que é da marca Danone.)
13 - Espécie pelo indivíduo: O homem foi à Lua. (=
Alguns astronautas foram à Lua.)
14 - Símbolo pela coisa simbolizada: A balança penderá para
teu lado. (= A justiça ficará do teu lado.)
Catacrese: Trata-se de uma metáfora que, dado seu
uso contínuo, cristalizou-se. A catacrese costuma ocorrer quando, por falta de
um termo específico para designar um conceito, toma-se outro
"emprestado". Assim, passamos a empregar algumas palavras fora de seu
sentido original.
Exemplos:
"asa da
xícara"
|
"batata da
perna"
|
"maçã do
rosto"
|
"pé da
mesa"
|
"braço da
cadeira"
|
"coroa do
abacaxi"
|
Perífrase ou Antonomásia: Trata-se de uma expressão que designa
um ser através de alguma de suas características ou atributos, ou de um fato
que o celebrizou. Veja o exemplo:
A Cidade Maravilhosa (= Rio de Janeiro) continua atraindo visitantes do
mundo todo.
Exemplos:
O Divino Mestre (= Jesus Cristo) passou a vida praticando o bem.
O Poeta dos Escravos (= Castro Alves) morreu muito jovem.
O Poeta da Vila (= Noel Rosa) compôs lindas canções.
Sinestesia: Consiste em mesclar,
numa mesma expressão, as sensações percebidas por diferentes órgãos do sentido.
Exemplos:
Um grito
áspero revelava tudo o que sentia. (grito = auditivo; áspero = tátil)
No silêncio escuro do seu quarto, aguardava os acontecimentos.
(silêncio = auditivo; negro = visual)
FIGURAS DE
PENSAMENTO
Dentre as figuras de pensamento, as mais comuns
são:
Antítese: Consiste na
utilização de dois termos que contrastam entre si. Ocorre
quando há uma aproximação de palavras ou expressões de sentidos opostos. O
contraste que se estabelece serve, essencialmente, para dar uma ênfase aos
conceitos envolvidos que não se conseguiria com a exposição isolada dos
mesmos. Observe os exemplos:
"O mito é
o nada que é tudo." (Fernando Pessoa)
O corpo é grande e
a alma é pequena.
"Quando um muro separa, uma ponte une."
"Desceu aos pântanos com os tapires; subiu aos
Andes com os condores." (Castro Alves)
Felicidade e tristeza tomaram
conta de sua alma.
Paradoxo: Consiste numa
proposição aparentemente absurda, resultante da união de ideias
contraditórias. Veja o exemplo:
Na reunião, o
funcionário afirmou que o operário quanto mais trabalha mais tem dificuldades
econômicas.
Amor é fogo que arde
sem se ver
É ferida que dói e
não se sente
É um contentamento descontente,
É dor que desatina
sem doer
“Bastou ouvir o teu silêncio
para chorar de
saudades”
Eufemismo: Consiste em empregar uma expressão mais suave, mais nobre ou
menos agressiva, para comunicar alguma coisa áspera, desagradável ou chocante.Exemplos:
Depois de muito
sofrimento, entregou a alma ao Senhor. (= morreu)
O prefeito ficou rico por meios ilícitos. (= roubou)
Fernando faltou com a verdade. (= mentiu)
Ironia: Consiste em dizer o contrário do que se pretende ou em
satirizar, questionar certo tipo de pensamento com a intenção de
ridicularizá-lo, ou ainda em ressaltar algum aspecto passível de crítica.
A ironia deve ser muito bem construída para que cumpra a sua finalidade; mal
construída, pode passar uma ideia exatamente oposta à desejada pelo
emissor. Veja os exemplos abaixo:
Como você foi bem na
última prova, não tirou nem a nota mínima!
Parece um anjinho aquele menino, briga com todos que estão por perto.
Hipérbole: É a expressão
intencionalmente exagerada com o intuito de realçar uma ideia.
Exemplos:
Faria isso milhões de vezes se
fosse preciso.
"Rios te correrão dos olhos, se
chorares." (Olavo Bilac)
Prosopopeia ou Personificação: Consiste em atribuir ações ou qualidades de seres animados a seres
inanimados, ou características humanas a seres não humanos. Observe os
exemplos:
As pedras andam vagarosamente.
O livro é um mudo que fala, um surdo que ouve, um cego
que guia.
A floresta gesticulava nervosamente diante da serra.
O vento fazia promessas suaves a quem o escutasse.Chora, violão.
Apóstrofe: Consiste na "invocação" de
alguém ou de alguma coisa personificada, de acordo com o objetivo do discurso
que pode ser poético, sagrado ou profano. Caracteriza-se pelo chamamento do
receptor da mensagem, seja ele imaginário ou não. Realiza-se por meio do vocativo. Exemplos:
Moça, que fazes aí parada?
"Pai Nosso, que estais no céu..."
"Liberdade, Liberdade,
Abre as asas sobre nós,
Das lutas, na tempestade,
Dá que ouçamos tua voz..." (Osório Duque Estrada)
Gradação: Consiste em dispor as ideias por meio de palavras,
sinônimas ou não, em ordem crescente ou decrescente. Quando a
progressão é ascendente, temos o clímax; quando é descendente,
o anticlímax. Observe este exemplo:
Havia o céu, havia a
terra, muita gente e mais Joana com seus olhos claros e brincalhões...
O objetivo do narrador é mostrar a expressividade
dos olhos de Joana. Para chegar a esse detalhe, ele se refere ao céu, à terra,
às pessoas e, finalmente, a Joana e seus olhos. Nota-se que o pensamento foi
expresso em ordem decrescente de intensidade. Outros exemplos:
"Vive só para
mim, só para a minha vida, só para meu amor". (Olavo Bilac)
"O trigo... nasceu, cresceu, espigou, amadureceu, colheu-se." (Padre
Antônio Vieira)
FIGURAS DE
CONSTRUÇÃO OU SINTÁTICAS
As figuras de construção ocorrem quando desejamos
atribuir maior expressividade ao significado. Assim, a lógica
da frase é substituída pela maior expressividade que se dá ao sentido.
Elipse: Consiste na omissão de um ou mais termos numa oração
que podem ser facilmente identificados, tanto por elementos gramaticais
presentes na própria oração, quanto pelo contexto. Exemplos:
1) A cada um o que
é seu. (Deve se dar a cada um o que
é seu.)
2)Tenho duas filhas, um
filho e amo todos da mesma maneira.
Nesse exemplo, as
desinências verbais de tenho e amo permitem-nos
a identificação do sujeito em elipse "eu".
3)Regina estava atrasada. Preferiu ir direto para o trabalho. (Ela,
Regina, preferiu ir direto para o trabalho, pois estava atrasada.)
4) As rosas
florescem em maio, as margaridas em agosto. (As margaridas florescem em
agosto.)
Zeugma: Zeugma é uma forma de elipse. Ocorre quando é feita a
omissão de um termo já mencionado anteriormente. Exemplos:
Ele gosta de
geografia; eu, de português.
Na casa dela só havia móveis
antigos; na minha, só móveis modernos.
Ela gosta de
natação; eu, de vôlei.
No céu há estrelas; na terra, você.
Silepse: A silepse é a concordância que
se faz com o termo que não está expresso no texto, mas sim com a ideia que ele
representa. É uma concordância anormal, psicológica, espiritual, latente,
porque se faz com um termo oculto, facilmente subentendido. Há três tipos de
silepse: de gênero, número e pessoa.
Silepse de Gênero
Os gêneros são masculino e feminino.
Ocorre a silepse de gênero quando a concordância se faz com aideia que
o termo comporta. Exemplos:
1) A bonita Porto Velho
sofreu mais uma vez com o calor intenso.
Nesse caso, o adjetivo bonita não está concordando com o
termo Porto Velho, que gramaticalmente pertence ao gênero
masculino, mas com a ideia contida no termo (a cidade de Porto
Velho).
2) Vossa excelência está preocupado.
Nesse exemplo, o adjetivo preocupado concorda com o sexo da
pessoa, que nesse caso é masculino, e não com o termo Vossa excelência.
Silepse de Número
Os números são singular e plural.
A silepse de número ocorre quando o verbo da oração não concorda
gramaticalmente com o sujeito da oração, mas com a ideia que nele está
contida. Exemplos:
A procissão saiu. Andaram por
todas as ruas da cidade de Salvador.
Como vai a turma? Estão bem?
O povo corria por todos os lados e gritavam muito
alto.
Note que nos exemplos acima, os
verbos andaram, estão e gritavam não
concordam gramaticalmente com os sujeitos das orações (que se encontram no
singular, procissão, turma e povo,
respectivamente), mas com a ideia de pluralidade que neles
está contida. Procissão, turma e povo dão a ideia de muita gente, por isso que
os verbos estão no plural.
Silepse de Pessoa
Três são as pessoas gramaticais: a
primeira, a segunda e a terceira. A silepse de pessoa ocorre quando há um desvio
de concordância. O verbo, mais uma vez, não concorda com o
sujeito da oração, mas sim com a pessoa que está inscrita no sujeito.
Exemplos:
O que não compreendo
é como os brasileiros persistamos em aceitar essa
situação.
Os agricultores temos orgulho de nosso trabalho.
"Dizem que os cariocas somos poucos dados aos
jardins públicos." (Machado de Assis)
Observe que os verbos persistamos, temos e somos não
concordam gramaticalmente com os seus sujeitos (brasileiros, agricultores e cariocas que
estão na terceira pessoa), mas com a ideia que neles
está contida (nós, os brasileiros, os agricultores e os cariocas).
Polissíndeto: É uma figura
caracterizada pela repetição enfática dos conectivos. Observe
o exemplo:
"Falta-lhe o
solo aos pés: recua e corre, vacila e grita,
luta e ensanguenta, e rola, e tomba, e se
espedaça,e morre." (Olavo Bilac)
"Deus criou o sol e a lua e as
estrelas. E fez o homem e deu-lhe
inteligência e fê-lo chefe da natureza.
Assíndeto: É uma figura caracterizada pela
ausência, pela omissão das conjunções coordenativas, resultando no
uso de orações coordenadas assindéticas. Exemplos:
Tens casa, tens
roupa, tens amor, tens família.
"Vim, vi, venci." (Júlio César)
Pleonasmo: Consiste na repetição de um termo ou ideia, com as
mesmas palavras ou não. A finalidade do pleonasmo é realçar a ideia, torná-la
mais expressiva. Veja este exemplo:
O problema da
violência, é necessário resolvê-lo logo.
Nesta oração, os termos "o problema
da violência" e "lo" exercem a mesma
função sintática: objeto direto. Assim, temos um pleonasmo do objeto direto,
sendo o pronome "lo" classificado como objeto direto
pleonástico.
Outro exemplo:
Aos funcionários,
não lhes interessam tais medidas.
Aos funcionários, lhes = Objeto Indireto
Nesse caso, há um pleonasmo do objeto indireto, e o pronome "lhes" exerce
a função de objeto indireto pleonástico.Exemplos:
"Vi,
claramente visto, o lumo vivo." (Luís de Camões)
"Ó mar salgado, quanto do teu sal são
lágrimas de Portugal." (Fernando Pessoa)
"E rir meu riso." (Vinícius de Moraes)
"O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem." (Manuel Bandeira)
Observação: o
pleonasmo só tem razão de ser quando confere mais vigor à frase; caso
contrário, torna-se um pleonasmo vicioso. Exemplos:
Vi
aquela cena com meus próprios olhos.
Vamos subir para cima.
Anáfora: É a repetição de uma ou mais palavras no início de
várias frases, criando assim, um efeito de reforço e de coerência. Pela
repetição, a palavra ou expressão em causa é posta em destaque, permitindo ao
escritor valorizar determinado elemento textual. Os termos anafóricos podem
muitas vezes ser substituídos por pronomes relativos. Assim, observe
o exemplo abaixo:
Encontrei um amigo ontem. Ele disse-me
que te conhecia. O termo ele é um termo anafórico, já que se
refere a um amigo anteriormente referido. Observe outro
exemplo:
"Se você
gritasse
Se você gemesse,
Se você tocasse
a valsa vienense
Se você dormisse,
Se você cansasse,
Se você morresse...
Mas você não morre,
Você é duro José!" (Carlos Drummond de Andrade)
Hipérbato ou
Inversão: É a inversão da
estrutura de uma frase, isto é, a inversão da ordem direta dos termos da
oração. Exemplos:
Ao ódio venceu o
amor. (Na ordem direta seria: O amor venceu ao ódio.)
Dos meus problemas cuido eu! (Na ordem direta seria: Eu cuido dos meus
problemas.)
FIGURAS DE SOM
Aliteração: Consiste na repetição
de consoantes como recurso para intensificação do ritmo ou como efeito
sonoro significativo. Exemplos:
Três pratos de trigo
para três tigres tristes.
O rato roeu a roupa do rei
de Roma.
"Vozes veladas, veludosas vozes,
Volúpias dos violões, vozes veladas
Vagam nos velhos vórtices velozes
Dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas."
Cruz e Souza (Aliteração em "v")
Assonância: Consiste na repetição ordenada
de sons vocálicos idênticos. Exemplos:
"Sou um mulato nato no sentido lato
mulato democrático do litoral."
Onomatopeia: Ocorre quando se
tentam reproduzir na forma de palavras os sons da
realidade. Exemplos:
Os sinos faziam blem, blem, blem, blem.
Miau, miau. (Som emitido pelo gato)
Tic-tac, tic-tac fazia o relógio da sala de jantar.
Cócórócócó, fez o galo às seis da manhã.